Um ano chato!


A maioria das pessoas, depois de chegar a certa idade, começa a honrar o próprio nome científico que um dia lhes fora atribuído: homo sapiens sapiens. Depois de elogiar os eternos princípios escritos pelo tempo, os mais velhos tendem a olhar as pessoas de cima, como se estivessem morando num monte bem alto, acima do mundo que corre nessa pressa cotidiana lá embaixo.

Depois de um ano tão conturbado como os outros e tão cheio de novidades e fatalidades como muitos, 2011 termina sem deixar saudades. Claro que em nossas mentes sempre ficará a lembrança dos acontecimentos históricos ocorridos no planeta, mas no fundo, só os livros irão fazer memória, publicando os novos artigos para o conhecimento das futuras gerações.

Um vídeo que fez muito sucesso no YouTube me chamou à atenção. Não sou de ficar procurando vídeos toscos por aí. Em relação à internet, quem passa dois dias sem olhar o Facebook já pode ser considerado um careta, desatualizado, retrógrado, ou seja, um “velho”. Bem, o vídeo era de uma entrevista com um ladrão. Ele, em sua lógica de cadeia alimentar, falava ao repórter que “era por causa dele que todos tinham emprego”, inclusive o próprio jornalista que segurava o microfone com a cara espantada.

Para o bandido, a sua atividade, seu ofício, enfim, seus roubos faziam com que o Estado precisasse de policiais, de juízes, de promotores, de jornalistas, de câmeras, escrivães, ou seja, roubar gerava emprego e movimentava a economia. “Veja quantas famílias se alimentam por causa de mim!”. Esquecendo do politicamente chato, no qual eu falava na semana passada, tentei entender, sem compromisso com a razão, o que essa pessoa proferia com sarcasmo e calma de monge.

Esses mesmos homo sapiens sapiens, que do ápice da vida proferem frases como “O mundo seria melhor se não houvesse violência”, ou “A paz reinaria se não existisse o sofrimento, ou bandidos e tráfico de drogas”, no fundo não conseguem imaginar como seria esse planeta tão fantasioso. Desde o Renascimento e até antes já se falava da Nova Atlântida. Pra quê? Pelo anseio do “homem que sabe” em saber que nunca vai conseguir viver numa fantasia!

Juntando as profecias dos experientes, as aspirações dos conformados e as conclusões do bandido, o que sobra já não é novidade, é chatice. Imaginem um mundo sem nenhuma mazela, onde ninguém sofra, sem terroristas, e que a corrupção seja nada mais que uma palavra em desuso na língua portuguesa? Tentou imaginar? E mais, imaginem também um trânsito livre, uma highway para vocês dirigirem à vontade, sem sinais vermelhos, sem obstáculos, e sem limite de velocidade? Pois é, não há graça em nada disso. Sabem por quê? Porque num mundo de fantasias, onde tudo é sempre perfeito, o individualismo periga tornar-se deus.

A pior coisa, por mais paradoxal que pareça, é não precisar dos outros. Não no sentido de dependência, mas cada qual, em sua função, boa ou ruim, merece existir, fazer o que lhe apetece, matar, morrer, viver, chorar, rezar, esperar e sonhar sonhos incompreensíveis.Todo mundo depende de todo mundo e essa engrenagem é como a cobra mordendo o próprio rabo do Ouroboros.

Não estou fazendo apologia à perpetuação do crime ou elogiando os bandidos e demais praticantes do ilícito. Se a maioria das religiões crê que Deus dá o livre arbítrio, porque nós, como criaturas poderemos traçar a meta de outrem? Mesmo os ateus, ou aqueles que crêem em outras denominações que em nada crêem também reconhecem que cada um é livre para fazer o que bem entende.

Será que o ladrão tinha razão? Não creio. Gerar empregos não é uma justificativa para cometer delitos. Porém, um mundo sem atritos é insosso. Um lugar sem problemas e sem angústia (sentimentos próprios dos homo sapiens sapiens) seria o céu. E para chegar até ele (segundo os que crêem) só após a morte.

Por enquanto, no mundo dos vivos, a gente acorda para respirar fumaça, passa raiva para ter gastrite, sonha para poder viver e acredita em várias coisas, dependendo da idade. Por isso os anos chegam e vão com aquele ar de “já passei por isso antes”.

Hoje é dia de retrospectivas pelas televisões. Mais uma necessidade das pessoas, a de rever quem morreu e já fora esquecido, lembrar dos que nasceram e não mais são notados, reconhecer os acontecimentos históricos que atualmente não passam de fragmentos no inconsciente, e vibrar com avanços das ciências que nunca saem do papel.

Por enquanto, as mensagens de que 2012 será melhor já entopem as redes sociais e os celulares. Que seja mesmo! Só não pode ser chato com o individualismo, a auto-suficiência da paz e a permanência de cada um no seu quadrado. As pessoas sem as pessoas não são ninguém. O homo sapiens sapiens sabe que sozinho ele não tem paz, e que com os outros também. Foco! Sonhar é bom, mas que esse mundo ideal seja dos mortos. Enquanto vivos, vivamos o mundo que se apresenta a todos nós a cada aurora!

Bons trabalhos para todos em 2012!!

16 comentários sobre “Um ano chato!

  1. Gostei do texto “Um ano chato!”, também achei esse vídeo marcante, quando o vi. O “fulano” lançou (sem querer) uma grande reflexão! A demonstração de uma racionalidade dissimulada e aparentemente sincera!

  2. Parabéns, vc escreve muito bem amigo. Lembraças sempre vão ser lembranças. O q não podemos deixar as coisas chatas q passaram continuarem em nossas mentes!!
    Parabéns mais uma vez lindo texto!!

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