Se eu fosse falar a verdade, acabaria morrendo com sobriedade. A verdade é um vício dúbio. Liberta, mas aprisiona tristezas. Fugir de tudo o que se sabe sobre verdades e mentiras é a opção mais apresentável, por ora.
Quando alguém mente, somente mente. A riminha é bonita e verdadeira. Mentir é como escapar de uma solidão. Mentir é como viver no rancor gélido de uma fera, que só sabe que é fera porque acreditou em nosso exemplo de feiura. Em nossa mentira.
Veja só (ou com alguém). Nada surge do acaso. As pessoas precisam ganhar as coisas. Precisam viver com estas coisas. Sabem que vão morrer por estas coisas. E morrem deixando estas coisas. Estas coisas são todas as coisas que existem.
Enquanto o povo vibra com a Copa do Mundo (por que escrevi isto com letras maiúsculas?), os candidatos fazem suas alianças e compram milhares de lotes de munição. A imprensa divulga todos os dias os novos aliados, as chapas compostas e as cabeças em degola. Ah, mas quem quer saber disso? O importante é a escalação da seleção da Colômbia. Bah!
Em breve, mentiras de todos os calibres serão disparadas pelas bocas cilíndricas, cheias de sorriso. E todos riem. E todos mentem. E a gente mente, dizendo que eles são mentirosos. E eles acreditam em nosso silêncio, porque sabem que silêncio é consentimento, ausência de som, botão verde e todas estas coisas que são todas as coisas que existem.
Eleição, campanhas, propostas… Tudo isso é muito chato. Chato mesmo. Qualquer mentiroso em sã consciência prefere ler quadrinhos da Turma da Mônica a mirar as análises políticas e sociológicas dos jornalões comprados. A gente sabe o que está por trás de tudo isso.
Só que os políticos precisam mentir. Da mesma forma que todos precisam mentir. Ninguém quer dizer que o colega de trabalho está ridículo com aquela camiseta amarela e azul, típica de um pirata do extinto PFL. Ninguém quer comentar que aquele líder da igreja é efeminado. Ninguém quer falar que viu o vereador recebendo propina. Ou seja, a gente precisa mentir! Então, por que eles não? Ora, os políticos são gente como a gente!
Os Aécios e as Dilmas por aí precisam comer (amido amassado pelo anjo de luz). Geralmente, os políticos não sabem dirigir com esmero. A maioria não conhece de música. Pouquíssimos jogam futebol. Um ou outro sabe persuadir, digo, orar (orar de orador e não orar de rezador já que estes abundam nas câmaras legislativas).
Os políticos não sabem usar armas. Não sabem vender farinha na feira. Não sabem fazer picolé. Não sabem engraxar sapatos. Não sabem costurar. Não sabem tocar a boiada para pastar na manga. Não sabem quem foi Priscila, a rainha do deserto. Não sabem suturar talhos. Não sabem quase nada. Que mintam, pelo menos. É uma forma simples e não-violenta de conseguir algum trabalho.
De que adianta, por exemplo, o Lula aparecer na TV e confessar que seus parceiros de dama são culpados de corrupção? Nada. No outro dia todos esquecerão porque as verdades sempre são esquecidas. Goebbels dizia que é mais fácil as pessoas acreditarem numa grande mentira dita muitas vezes do que numa pequena verdade dita apenas uma vez. Ou você acha que o Lula faria sete vídeos confessando que seus correligionários passaram a mão no imposto suado que a gente paga? Nada com coisa nenhuma.
Outro dia um angolano afirmou que o problema do Brasil são os brasileiros. Ele mentiu, sabia? Mentiu porque falou a verdade. E falar a verdade é como mentir. A gente diz e ninguém acredita, porque é mentira. Não, eu não fumei maconha nem bebi Dolly.
Quando a copa acabar, a politicagem vai começar. Então, prepare seus bonés vermelhos ou suas camisas de manga longa, cor sim, cor não, e acompanhe o candidato ao governo do estado, quando este passar por sua rua em cima de uma caminhonete. Acene. Dê a mão. Acredite que ele realmente irá construir 6 mil hospitais em Janeiro de 2015. Porque ele vai sim! Vai fazer porque é mentira. Por isso é verdade.
No final todos morrerão deixando tudo por aí. Todos mentirosos. Todos felizes. Todos de mentira. Deixar as coisas como estão é o gesto mais sábio. Tão real que chega a ser mentira. Porque dizer que adorou a jaqueta couro de onça ridícula (que ganhou de presente) é a mesma coisa que prometer cuidar do povo pobre e no dia primeiro de janeiro do ano seguinte cuidar do laquê! E só do laquê!
Se Cazuza fosse vivo, cantaria assim: "Hipocrisia, eu quero uma pra viver". Por isso já escolhi a minha hipocrisia. Prometo mentir enquanto mentirem. Eles vão dizer que está tudo bem e eu acreditarei. Eles vão dizer que estou morto e eu morrerei. Eles vão dizer que estou vivo, e eu direi um piedoso amém. Partiu Neymar. Passou por dois. Lançou pro Marcelo. Vai Marcelo! Ele chuta e… Goooooooool! Contra?
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